segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Consenso da Coerção

A história brasileira das décadas de 60 até 80 foram marcadas pela luta de uma juventude proveniente da classe média, principalmente, carioca e paulistana contra a ditadura militar e suas medidas autoritárias e coercitivas.

Entretanto, hoje em dia, na primeira década do século XXI, com a ditadura fazendo parte dos livros de história e aquela juventude como a atual terceira idade, vemos que o caminho contrário em relação aquela época está acontecendo. Enquanto muitos lutaram contra o fim de um sistema que impunha o modo como deveríamos viver, hoje em dia, em plena democracia, independentemente de ser boa ou ruim, estamos pedindo mais leis que regulamentem nossas vidas. Enquadramos-nos novamente no papel de cidadão, que na sociedade moderna é aquele que reclama pelos seus direitos, já que, a reclamação é vista como algo positivo.

A perda de poder da religião na sociedade é um dos motivos pelos quais Nietzsche denuncia a morte de Deus, pois na idade média, a religião era muito presente no cotidiano como marcadora do tempo e por estar atrelada a política. Todavia, isso começou a mudar com as denúncias de Hobbes, Maquiavel e Espinosa de que a religião tem que estar separada da política. Porém, vemos que a cultura ressentida, baseada neste Deus que agora está morto, que domestica o nosso corpo para atitudes com niilistas, faz com que, também, passemos a agir como massa. Logo, por agirmos assim, não nos tornamos seres ativos, que agem segundo seus interesses refletidos e sim, passivos, pois apenas recebemos ordens. Agimos como se Deus existisse, pois damos aos maiores ídolos da modernidade, Estado e ciência, o papel de controlador das nossas vidas. Portanto, a morte de Deus de nada bastou, porque nada se afirmou em seu lugar e, continuamos agindo segundo a moral cristã.

Não se age seguindo aquilo que é melhor para si mesmo, mesmo relevando que esse si mesmo, envolva uma noção de coletivo de que o bem-estar de que um indivíduo depende dos demais ao seu redor, pois dependemos dos outros para tudo. Só poderia, por exemplo, estar escrevendo este texto em meu computador, porque alguém em um lugar bem longe o fez, pois meu pai o comprou e, porque meus professores me ensinaram esses conteúdos que estou tentando transmitir. Agimos de maneira espontânea, pois não refletimos sobre essa moral ressentida. Sendo assim, estamos fazendo as coisas de maneira alienada dos nossos interesses, pois agir instintivamente é, apenas, reproduzir os valores praticados em nossa sociedade.

Essa apropriação da idéia de cidadão e dessa cultura negadora da vida faz com que as pessoas lutem e queiram leis que regulamentem suas vidas e que, como conseqüência, aumente o sentimento de culpa nos outros, pois o Estado e a ciência juntos, negando algo, fazem com que aqueles que atuem contrariamente a estes, estejam definitivamente errados. Tornamos-nos, então, servos das leis, pois temos nossas vidas impostas, sem possibilidades de criação. Isso sem considerar a mídia, que utiliza essa regulamentação como exemplo para todos, fazendo com que queiramos seguir isso.

Um bom e recente exemplo para isso pode ser a lei que proibirá o fumo em diversos locais fechados. O interessante seria que todos tivessem a consciência de que seu mal não precisa ser compartilhado com os outros que não tem nada a ver com ele. Por outro lado, não seria necessária uma lei para enquadrar cada vez mais nossa vida, dizendo o que podemos e não podemos fazer.

No entanto, isso está estritamente ligado a nossa educação. Penso que as pessoas só poderão refletir sobre essas questões quando tiverem contato com um ambiente que promova uma reflexão sobre a consciência do coletivo, de como a atitude de um indivíduo interfere nos demais ao seu redor, fazendo com que uma atitude individual que prejudique o outro de maneira proposital ou que tenha, simplesmente, a consciência do sujeito, tenha o caráter autoritário. Contudo, devo considerar que uma sociedade que preza tanto pelo individualismo e que atribui a ele um aspecto natural através de uma forte ideologia, dificulta e muito qualquer mudança educacional, porém, não a torna impossível.

Entretanto, a partir do dia 7 de Agosto, sexta-feira, não será permitido fumar em locais como condomínios, hotéis, motéis, locais de trabalho fechados, estádios, restaurantes e bares. Contudo, cada local citado acima tem suas exceções para o fumo.

Além de ser uma lei que vai regulamentar nossas vidas, essa medida trará consigo mesma ações preventivas de casas noturnas. Um dos motivos dessas ações preventivas são as multas para os locais que forem pegos ou denunciados com fumantes que, receberam indenizações que variam de 792,50 Reais até 30 dias de interdição. Não é a toa que além da própria lei, teremos que nos acostumar com o alto número de vigilantes observando o que fazemos atentamente em locais que terão o uso do fumo proibido, pois muitos locais contratarão a partir de sexta-feira, dia 7 de agosto de 2009, seguranças que fiscalizarão fumantes que tentem burlar essa lei como foi exposto na Folha de S. Paulo no dia 2, domingo, no caderno Cotidiano, no ano de 2009.

2 comentários:

  1. é osso. é interessante pensarmos também que caso houvesse uma reflexão por parte dos fumantes, prévia à instauração de uma lei que os coibisse, não seria necessário a instauração por meios legais de regulamentar os interesses. Bastaria que os indivíduos pensassem não só no que querem, fumar, mas também no que a maioria quer, que eles não fumem, pelo menos não próximos à ela. Pra mim, chega a ser irônico esse paradoxo de sociedade, entre o querer individual e o querer coletivo, pois enquanto temos as nossas vontades individuais, ainda compartilhamos com diversos grupos, outras vontades, pois o cara que fuma necessariamente compartilha de algum outro interesse, como por exemplo, um exemplo bobo, de que os dejetos animais sejam recolhidos pelos donos. E enquanto não se vê na obrigação de respeitar a vontade da maioria no caso do fumo, enxerga o dono que não cata o cocô do próprio cachorro cachorro de maneira repreensiva. E vice-e-versa, o cara que repreende o fumo, não pega o cocô do próprio cachorro. E essa consecutiva soma quase infinita de interesses à que se respeita ou não, faz com que os conflitos não sejam perceptíveis no dia-a-dia, e o ser inconsciente, nem prestando atenção ao que faz, dá uma baforada na cara de alguém que não fuma, ou deixa o seu animal defecar na via pública.
    O jogo fica muito complexo para ser analisado nos curtos segundos do tempo em que se vive, e só se reflete sobre isso quanto sentado em casa, instigado por um blog, por uma matéria na televisão, por um texto que seja.
    Que grande tabuleiro é a sociedade! Onde cada peça tem seus movimentos próprios... e na falta de algum consenso de regular tal caos, sugere-se a instauração da instituição chamada Estado, e o manual fica pronto, na forma de leis.
    Agora, o que realmente é jogado é outra história.

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  2. "e aquela juventude como a atual terceira idade"??? tá chamando minha mãe de velha? haha, to brincando.
    tá muito, muito bom. muito bem feito. concordo plenamente.

    besos companheiro ;)

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