sábado, 21 de novembro de 2009

São Carlos - Da escravidão ao Tecnopólo

Que este título não passe uma idéia positivista, nem de uma linha evolucionista da história, já que tento fugir dela. Porém, que ajude a escancarar um problema crônico brasileiro; a desigualdade, ou mais que isso, o choque entre o arcaico e o moderno.

A cidade de São Carlos é referência por causa das suas universidades, USP e UFSCAR. Mais do que possuir universidades de tal porte, esses centros possuem pesquisas muito avançadas. Enquanto o LATAR (laboratório de tratamento e reuso das águas) produz tecnologias de ponta, a alguns metros dali, no centro comercial da cidade, são poucos que sabem algo concreto referente às universidades. Isso nos faz refletir sobre uma alienação geográfica, comum no Brasil. Essa separação tão forte é fruto de um processo histórico e cultural, pois desde sempre, as empresas que aqui se instalaram, por exemplo, tiveram facilidades fiscais e uma fraca fiscalização ambiental. Nunca foi exigido pelo nosso governo, que se fizesse algo para a população local, depois de utilizar seus recursos naturais. Logo, essas empresas, ou instituições públicas estão presentes fisicamente nesses locais, todavia constituem relações muito fracas.

Portanto, a afirmação de que essas universidades têm grande importância social, é uma constatação do ponto de vista de uma pequena parcela da sociedade, ou seja, uma elite que pode acessá-la.

Curioso que essa cidade acaba sendo considerada pela própria prefeitura e por vários moradores através da propaganda feita pelo município, como a capital da tecnologia, mesmo tendo seu passado extremamente ligado a produção cafeeira, e infinitamente esquecido e apagado pelo sistema educacional da região. Cultura cafeeira que por sinal ajudou a fundar a cidade, com os privilégios que foram cedidos ao Conde do Pinhal.

Porém, será que é do interesse, ou faz diferença para as autoridades o conhecimento da maioria sobre disso? E sobre o que se desenvolve nas universidades, ou até do poder econômico da cidade? Pois, se tratamos de uma cidade com tais características, onde estão esses benefícios que não são refletidos para a maioria? Já que ao entrevistar essa população, foram observadas reclamações e carências a todas as áreas de serviços fundamentais que deveriam ser responsáveis pelo poder público.

O conhecimento sobre a história da sua região e, como conseqüência, a atual situação dela é fundamental por diversos motivos, entre eles os políticos e até do conhecimento como fim em si mesmo, sem um desejo prático instantâneo. Contudo, falar isso de São Carlos é simples, mas e nós? Conhecemos a história da nossa cidade? Será que isso é da maioria? E sobre a USP?

terça-feira, 3 de novembro de 2009

É pixo neles!

Vivemos em uma cidade de fato singular, acabo de saber que foi aqui em São Paulo que a pixação teve sua origem, sendo assim um movimento legítimo da Paulicéia ritmada.
A Pixação é algo que nos deparamos no nosso dia-dia adentrando nossa frente em cada esquina, cada muro, cada espaço urbano.
Confesso ter passado grande parte da minha vida reprimindo esse tipo de movimento devido a sua grosseria estética, se é que posso cometer esse julgamento pouco digno, mas de uns tempos para cá tenho me pego pensando e defendendo os pixadores da São Paulo que não dorme.
Pelo simples fato de ser um legítmo movimento de apropriação do espaço urbano que nos é tão estranho. Deixar o nome lá pixado em preto com uma tipografia pouco compreensível nas portas do Banco Safra ou da Venda de Verduras do italiano anarquista nada menos é do que tornar a cidade menos estranha aos seus habitantes, e principalmente aqueles menos privilegiados, a quem ela normalmente é mais hostil e rude.
Não hei de entrar no mérito do desenho em termos qualitativos, ou mesmo se aquilo é de fato arte, pois embora eu a considere, não é esta a questão na qual pretendo me apegar.
Mas sim como as pixações interferem no cotidiano, e se levadas para a galeria elas ainda trazem sua essência enquanto manifestação artística urbana e popular. Em primeiro lugar é importante discutirmos o que é público, o que é o espaço público. O recorrente argumento de que aquele muro pertence a um "cidadão de bem" e o pixador não tem o direito de vandalisar aquilo com sua natureza criminal é bem presente nos discursos de quem se manifesta contra o movimento de pixação, logo, começo nesta mesma chave, só que ao contrário.
Primeiro eu gostaria de ir logo ao ponto, bem claramente: Do muro pra dentro é seu, mas do muro para fora, incluindo o muro, meu querido, é tudo nosso! É da cidade, e sendo da cidade pertence a todos, todos podem e devem interferir naquele espaço pois a cidade não deve ter sua funcionadlidade ligada somente a estadia de seus munícipes, ou ser uma paisagem tranquila, a cidade é o lugar dos confrontos, entre as ideologias, entre as realidades e no caso entre as estéticas.
E antes que venham com aquele discurso fraco e batido de que "seu direito acaba onde o meu começa" digo lhe que no caso os direitos estão todos misturados, e se depender de mim e dos pixadores, eles seram escritos e atravessados nos muros das nossas casas.
Então cabe a nós interferirmos no espaço urbano. A nossa representação de classe(filhos da burguesia), cá entre nós, não tem nenhuma produção ligada a este tipo de intervenção (podem desistir! que consumir não é intervenção no espaço, pelo contrário, e a reafirmação de uma estética de massa). Os pixadores hoje, são os que melhor modificam e se apropriam deste espaço, escrevendo os seus nomes, se indentificando com a cidade.
Mas não me venham também com discurso de ONG, que sempre, repito, sempre é hipócrita e mercadológico, de que vai selecionar um muro no seu beco particular ou da sua galeira de "strett-art" ou espaço do meio-ambiental para que os pixadores e grafiteiros desenhem e que todos possam conviver em paz. Esse discurso pode parecer uma alternativa à estética atual,mas nos engana, pois ele a reafirma, se apropriando desses movimentos, e vendendo suas mercadorias atraves desses movimentos(vejam os becos da Vila Madalena, o quão mercadoria aquilo já virou.).
Lembremos, meus caros amigos, não estou discutindo estética, pois definitivamente os becos da Vila Madalena, entre outras centenas parecidos são belíssimos e confesso ser conservador demais para discutir estética, digamos que minha caretisse artística não cai bem à essa discussão tão revolucionária.
Também não peço que os governos a partir de então incluam pixo nas "leis das cidades limpas", não quero ver o pixo sendo apropriado pelos tucanos e democratas com suas confusões urbanas ou até mesmo pelos petistas que em grande parte, só fazem média, eu quero ver o pixo na ilegalidade, pois só um movimento esteticamente violento pode responder a altura a violência estetica do capitalismo.
A critica e a resposta tem que ser radical, não pode ir para as galerias, não que as galerias não sejam o lugar da revolução estetica, mas esta especifica só é revolucionaria quando feita na urbes, na galeria ela fica domada, como o capital a quer, calminha.(já imaginou um pixo da Hello Kitty?)
Eu entendo que estes artistas ou interventores tenham de ganhar seu dinheiro e que todo mundo quer satisfazer seus desejos, mas na galeria não é pixo, é uma copia estética do pixo, mas não o é!
Não podemos levar os pixos para as galerias convencionais, temos que entendermos a rua como a galeria legítima para esse tipo de arte, temos de mudar nossa concepção de cidade, a cidade é um museu, uma galeria, cabe a nós ressigficá-la frente ao ritmo de produção. As obras já estão expostas, devemos diminuir nosso ritmo para vê-las.
Mas não devemos entender a cidade como uma galeria que proteje suas obras, por serem elas sacras, pelo contrário, a insegurança da obra na cidade é o seu maior valor museológico, a obra enquanto interina,uma obra na cidade que não seja perene, que não fique trancafiada em uma caixa de vidro, como a Monalisa. Que seja destrutível, para que então, possa ser recriada e assim se sustentará a verdadeira arte urbana.
Confesso não apreciar a estética do pixo, mas a arte e os movimentos estéticos em geral são como a espuma de uma bebida, elas só se sobressaem do que de fato é a sociedade. A sociedade planta sua própria cultura e a sua arte, e cabe a nós entendê-las melhor. Uma sociedade como a de hoje não pode pedir mais de suas formas artísticas populares do que o pixo, o grafite, pois eles são legitimos e refletem de forma contrária uma cidade de passagem.
Então meus caros, me manifesto aqui favorável à pixação, e caso esta venha a ocorrer no meu muro, aconselho o mesmo tipo de entendimento caso aconteça a vocês: Se dê por contente que seu muro foi apropriado, foi modificado. Caso não goste da modificação, vá até o muro do teu vizinho ou até o de alguém do outro lado da cidade e pixe, modifique,mas não resmungue por algo tão interessante e popular, pois aqui isto é raro, você acabada de presenciar na sua pele, digo parede, uma movimentação política de apropriação urbana do Séc XXI, é mais raro que ouro. Se satisfaça por ter ocorrido contigo, entenda o privilégio que você teve, e por fim, respeite a pixação e seus interventores, os pixadores.