terça-feira, 3 de novembro de 2009

É pixo neles!

Vivemos em uma cidade de fato singular, acabo de saber que foi aqui em São Paulo que a pixação teve sua origem, sendo assim um movimento legítimo da Paulicéia ritmada.
A Pixação é algo que nos deparamos no nosso dia-dia adentrando nossa frente em cada esquina, cada muro, cada espaço urbano.
Confesso ter passado grande parte da minha vida reprimindo esse tipo de movimento devido a sua grosseria estética, se é que posso cometer esse julgamento pouco digno, mas de uns tempos para cá tenho me pego pensando e defendendo os pixadores da São Paulo que não dorme.
Pelo simples fato de ser um legítmo movimento de apropriação do espaço urbano que nos é tão estranho. Deixar o nome lá pixado em preto com uma tipografia pouco compreensível nas portas do Banco Safra ou da Venda de Verduras do italiano anarquista nada menos é do que tornar a cidade menos estranha aos seus habitantes, e principalmente aqueles menos privilegiados, a quem ela normalmente é mais hostil e rude.
Não hei de entrar no mérito do desenho em termos qualitativos, ou mesmo se aquilo é de fato arte, pois embora eu a considere, não é esta a questão na qual pretendo me apegar.
Mas sim como as pixações interferem no cotidiano, e se levadas para a galeria elas ainda trazem sua essência enquanto manifestação artística urbana e popular. Em primeiro lugar é importante discutirmos o que é público, o que é o espaço público. O recorrente argumento de que aquele muro pertence a um "cidadão de bem" e o pixador não tem o direito de vandalisar aquilo com sua natureza criminal é bem presente nos discursos de quem se manifesta contra o movimento de pixação, logo, começo nesta mesma chave, só que ao contrário.
Primeiro eu gostaria de ir logo ao ponto, bem claramente: Do muro pra dentro é seu, mas do muro para fora, incluindo o muro, meu querido, é tudo nosso! É da cidade, e sendo da cidade pertence a todos, todos podem e devem interferir naquele espaço pois a cidade não deve ter sua funcionadlidade ligada somente a estadia de seus munícipes, ou ser uma paisagem tranquila, a cidade é o lugar dos confrontos, entre as ideologias, entre as realidades e no caso entre as estéticas.
E antes que venham com aquele discurso fraco e batido de que "seu direito acaba onde o meu começa" digo lhe que no caso os direitos estão todos misturados, e se depender de mim e dos pixadores, eles seram escritos e atravessados nos muros das nossas casas.
Então cabe a nós interferirmos no espaço urbano. A nossa representação de classe(filhos da burguesia), cá entre nós, não tem nenhuma produção ligada a este tipo de intervenção (podem desistir! que consumir não é intervenção no espaço, pelo contrário, e a reafirmação de uma estética de massa). Os pixadores hoje, são os que melhor modificam e se apropriam deste espaço, escrevendo os seus nomes, se indentificando com a cidade.
Mas não me venham também com discurso de ONG, que sempre, repito, sempre é hipócrita e mercadológico, de que vai selecionar um muro no seu beco particular ou da sua galeira de "strett-art" ou espaço do meio-ambiental para que os pixadores e grafiteiros desenhem e que todos possam conviver em paz. Esse discurso pode parecer uma alternativa à estética atual,mas nos engana, pois ele a reafirma, se apropriando desses movimentos, e vendendo suas mercadorias atraves desses movimentos(vejam os becos da Vila Madalena, o quão mercadoria aquilo já virou.).
Lembremos, meus caros amigos, não estou discutindo estética, pois definitivamente os becos da Vila Madalena, entre outras centenas parecidos são belíssimos e confesso ser conservador demais para discutir estética, digamos que minha caretisse artística não cai bem à essa discussão tão revolucionária.
Também não peço que os governos a partir de então incluam pixo nas "leis das cidades limpas", não quero ver o pixo sendo apropriado pelos tucanos e democratas com suas confusões urbanas ou até mesmo pelos petistas que em grande parte, só fazem média, eu quero ver o pixo na ilegalidade, pois só um movimento esteticamente violento pode responder a altura a violência estetica do capitalismo.
A critica e a resposta tem que ser radical, não pode ir para as galerias, não que as galerias não sejam o lugar da revolução estetica, mas esta especifica só é revolucionaria quando feita na urbes, na galeria ela fica domada, como o capital a quer, calminha.(já imaginou um pixo da Hello Kitty?)
Eu entendo que estes artistas ou interventores tenham de ganhar seu dinheiro e que todo mundo quer satisfazer seus desejos, mas na galeria não é pixo, é uma copia estética do pixo, mas não o é!
Não podemos levar os pixos para as galerias convencionais, temos que entendermos a rua como a galeria legítima para esse tipo de arte, temos de mudar nossa concepção de cidade, a cidade é um museu, uma galeria, cabe a nós ressigficá-la frente ao ritmo de produção. As obras já estão expostas, devemos diminuir nosso ritmo para vê-las.
Mas não devemos entender a cidade como uma galeria que proteje suas obras, por serem elas sacras, pelo contrário, a insegurança da obra na cidade é o seu maior valor museológico, a obra enquanto interina,uma obra na cidade que não seja perene, que não fique trancafiada em uma caixa de vidro, como a Monalisa. Que seja destrutível, para que então, possa ser recriada e assim se sustentará a verdadeira arte urbana.
Confesso não apreciar a estética do pixo, mas a arte e os movimentos estéticos em geral são como a espuma de uma bebida, elas só se sobressaem do que de fato é a sociedade. A sociedade planta sua própria cultura e a sua arte, e cabe a nós entendê-las melhor. Uma sociedade como a de hoje não pode pedir mais de suas formas artísticas populares do que o pixo, o grafite, pois eles são legitimos e refletem de forma contrária uma cidade de passagem.
Então meus caros, me manifesto aqui favorável à pixação, e caso esta venha a ocorrer no meu muro, aconselho o mesmo tipo de entendimento caso aconteça a vocês: Se dê por contente que seu muro foi apropriado, foi modificado. Caso não goste da modificação, vá até o muro do teu vizinho ou até o de alguém do outro lado da cidade e pixe, modifique,mas não resmungue por algo tão interessante e popular, pois aqui isto é raro, você acabada de presenciar na sua pele, digo parede, uma movimentação política de apropriação urbana do Séc XXI, é mais raro que ouro. Se satisfaça por ter ocorrido contigo, entenda o privilégio que você teve, e por fim, respeite a pixação e seus interventores, os pixadores.

Um comentário:

  1. Quarenta, confesso que tinha uma posição totalmente contra a pixação antes de ler seu texto. Também não estou totalmente convencido, mas me fez e fará pensar por um bom tempo provavelmente. Obrigado por aceitar fazer parte do blog!

    ResponderExcluir